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ANPOLL SE PRONUNCIA SOBRE O OFÍCIO CIRCULAR CAPES 1/2019

Brasília, 09 de maio de 2019

O Ofício Circular 1/2019, do Gabinete da Presidência da CAPES, datado de 08 de maio, no qual determina o recolhimento de bolsas não utilizadas – isto é, cotas que, num breve intervalo de tempo entre a chamada de editais, classificação e publicação de resultados aguardam cadastramento de novos bolsistas nos programas DS, PROEX, PROSUC, PROSUP e PNPD – representa mais um duro golpe no Sistema Nacional de Pós-Graduação Brasileiro. Este breve intervalo de tempo em que as bolsas ficam “ociosas” não significa que os recursos não estão sendo empregados adequadamente pelos programas. No entanto, reside no ato de recolhimento de bolsas, mais uma estratégia para o corte de recursos aplicados ao desenvolvimento das ciências. Certamente, os programas da área de Letras e Linguística, ou sua nova denominação junto à CAPES de Linguística e Literatura, sofrerão com o corte de bolsas em seus cursos de mestrado e doutorado. Isso pode representar o não preenchimento de vagas em novos processos de seleção, o que acarreta, em termos práticos, o enxugamento da área nos próximos anos, o que poderia funcionar como “justificativa” para fechamentos de cursos na área das humanidades. É importante pensar que um sistema de pós-graduação se faz com pesquisadores-professores experientes, com maturidade e liderança científica para conduzir equipes de trabalho, técnicos qualificados que dão suporte, laboratórios, bibliotecas, centros de documentação e infraestrutura necessária e, principalmente, estudantes de pós-graduação. Um estudante de pós-graduação é, como lembra a presidente da Associação Nacional de Estudantes de Pós-Graduação, Flávia Calé, um profissional com formação superior e em formação continuada que deve trabalhar num “regime de manutenção estável”. Tal estabilidade parece estar muito longe de ser atingida. Aqui o descaso é mais gritante! Há 6 anos sem reajustes, as bolsas acumulam perdas inflacionárias da ordem de 36%. Se antes havia o argumento de que a bolsa não se reajustava para atender mais pessoas, agora nem atende com dignidade o profissional e o que é pior, não atenderá às novas demandas. É preciso esclarecer a opinião pública que bolsas não são esmolas governamentais, elas cumprem o papel de alavancar o desenvolvimento social e científico de uma nação. As bolsas são livres de impostos exatamente porque remuneram um trabalho que não raras vezes extrapola a jornada de 44h semanais. Um pesquisador é cobrado pelo resultado de trabalho no final de semana. Ele não tem feriado, não tem noite que seu ofício não exija a leitura, o parecer, a entrega do artigo, do relatório dentro prazo. O pesquisador bolsista não tem férias, não tem 13º. Estamos tratando aqui de um contingente de mais de 300 mil pesquisadores bolsistas num País como o Brasil, País com mais de 5.500 cursos de pós-graduação, os quais muitos deles já abriram seus editais para novos ingressos contando com os repasses dessas “bolsas ociosas”, agora confiscadas em nome de uma política ultraliberal que ataca o patrimônio científico e acadêmico brasileiro como nunca antes visto na história brasileira. Uma política insustentável do ponto de vista lógico e racional, cujo seu limite anuncia a aniquilação, a médio prazo, do próprio Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG). Política esta que afronta inclusive o próprio Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) 2011-2020 e compromete as metas de avaliação, avanço e inserção internacional dos programas, já neste quadriênio. A nossa área, assim como toda área de Ciências Humanas, já vem sendo penalizada desde 2015 com o corte de recursos, que com a remodelação da matriz de custeio do PROAP instituiu a diferenciação de repasse para áreas de conhecimento, chegando a repassar 28,57% a menos em alguns casos. O desapreço às Humanidades com o propósito de obter vantagens no mundo de produção de mercadorias tem deixado a ética, os valores solidários e as ações promotoras do bem comum para um segundo plano. As Ciências Humanas, as Letras e a Linguística, por pensarem a linguagem em relação com o sujeito social e suas temporalidades históricas, acabam tendo um papel vital para a promoção do bem-estar e da governança, agindo direta ou indiretamente nas instituições sociais. Fazer pós-graduação e ciência, para nós, significa não raras vezes colocar em xeque as verdades produzidas na própria academia, a qual, por ser realizada por humanos, também corre o risco da cegueira provocada pelo deslumbramento da técnica. As Letras e Linguística existem porque a sociedade precisa do discurso da (auto)crítica. Nunca é demasiado lembrar que a mesma ciência que constrói maravilhas pode também varrer a vida no planeta por isso ser tão necessária a ponderação do pensamento crítico de teor humanista. O recolhimento de bolsas que, na prática, significa um corte de bolsas para os programas afeta todas as áreas. Ontem, representando a ANPOLL em Brasília, compareci a um ato junto com a SBPC e outras associações científicas no Congresso Nacional, para o lançamento da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br), em que vários parlamentares ligados à ciência e à educação trouxeram falas de lutas, de esperança e de resistência. Houve uma mobilização, pode-se dizer, histórica no congresso em nome da ciência. Associações de várias áreas do conhecimento estavam unidas buscando construir um diálogo suprapartidário e com representantes parlamentares e do MCTIC no sentido de não apenas assegurar verbas para ciência, mas de fazer ressoar a voz da comunidade científica. A mesma voz que defende a ciência é a que se levanta para a defesa da pós-graduação. Assim, o encontro das associações de ontem foi mais que sugestivo para a abertura de uma frente de defesa da Pós-Graduação, principal berço da pesquisa no País. A CAPES deve se explicar sobre os cortes das bolsas e sobre suas ações e metas para o cumprimento do PNPG 2011-2020. Juntas, as ANPs são mais fortes e constituem uma ampla comunidade em defesa da pós-graduação. Os coordenadores de programas devem buscar juntos a alunos, professores, técnicos, gestores públicos, políticos e agentes sociais o diálogo para construir um sistema educacional mais justo e igualitário para o país.

Frederico Augusto Garcia Fernandes
Presidente da ANPOLL – 2018-2020

*Este texto contou com a leitura e sugestões dos membros da Diretoria da ANPOLL, a
quem agradeço as inestimáveis contribuições e correções.

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